No Publico, 24/03/10
O economista César das Neves explica logo no início (...): “Ser boa pessoa, como todos sabemos, nunca é coisa que se consiga daquela forma que os executivos usam para conseguir as outras coisas. Por isso, não se pode resumir, simplificar, mecanizar”.
Num momento em que a crise financeira e económica faz salpicar milhares de vezes a palavra “ganância” por textos jornalísticos, ensaístos, humorísticos e de restante natureza; um trabalho sobre ética parece vir a propósito. Sobretudo quando nem todo os “Madoff” que pululuam pelo mundo estão numa barra de tribunal ou a caminho dela. César das Neves é claro: a ética não serve para atingir a perfeição, serve para ser boa pessoa. Isto é, com falhas e erros pelo caminho, o sucesso do empresário mede-se pela actuação no sentido de fazer o melhor possível.
Comentário:
É bem um sinal dos tempos que seja um economista a debruçar-se sobre o tema da ética num livro de 574 páginas. Nas relações de trabalho, em muitas instituições e organizações, a falta de ética vai-se tornando a norma e pugnar pela ética é ser remetido à condição de excluído. Muita muita gente tenta dissimular a primazia dos seus poderes e interesses particulares, insinuando que é na ponta da chibata que está a elevada produtividade e o interesse geral. Os “Madoff”, não apenas desse ponto de vista, mas igualmente do ponto de vista da honestidade e transparência em todas as esferas de actuação, não se movimentam apenas no mundo das finanças e nas empresas... Os "Madoff" são todos aqueles que ocupando lugares de relevo em qualquer domínio de actividade, exercem as suas funções sem ética nem moral, corroendo desse modo o tecido humano e organizacional, com grave prejuízo para o desenvolvimento da actividade humana em que se movimentam. A ética, para além de um valor fundamental de uma sociedade humanista, é hoje mais do que nunca um problema da economia, no seu sentido mais lato. A tecnologia como valor supremo aliena o Homem e faz-nos regredir civilizacionalmente. É nos valores humanos fundamentais - a dignidade humana, a justiça, a liberdade, a solidariedade... - que teremos que retomar o processo civilizacional, libertando a criatividade, a imginação e a capacidade de sonhar do espírito humano, para fazer face à complexidade dos tempos que vivemos. Não se trata da "inovação" na sua vulgar conotação científico-tecnológica de que tanto se fala; é algo muito para além disso que o Homem de hoje precisa.
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