quarta-feira, 16 de julho de 2008

OS TRIBUNAIS COMO ARMA DE INTIMIDAÇÃO

Num Estado de Direito Democrático servem os Tribunais para aplicar a Justiça. Porém, em Portugal, o cidadão comum está longe de ter essa percepção – é um lugar comum dizê-lo. A justiça, quando chega, vem sempre fora de tempo, indiferente à ruina irreversível da vida de muitas pessoas, que não suportaram os danos da injustiça inicial mais os danos do tempo de espera por uma justiça que já não o chega a ser.

Os pobres não conseguem que um bom advogado se interesse por uma questão que queiram levar a Tribunal. Podem até ser recebidos, mas os seus processos ficam lá no fundo das prioridades, acabando no esquecimento e na perda de paciência de quem espera. Já para os ricos e poderosos qualquer questão se torna prioritária para advogados de grande nomeada. Os ilimitados honorários são forte argumento para um empenhado esforço nas manobras dilatórias, nas jogadas processuais e nos truques de retórica que conseguem convencer o juiz da inocência do cliente bem pagante.

Mas há um lado da justiça dos "fortes" que é particularmente perverso: o recurso aos tribunais para a intimidação dos cidadãos. Certos poderes recorrem com facilidade à queixa contra cidadãos cujo “crime” mais não é do que terem uma conduta cívica que condiciona e incomoda a pretensão de livre arbítrio de tais poderes. Tomam-se por vítimas para atacar quem não se submete à sua vontade. Sei da minha própria experiência o que isso é, e não pude deixar de me recordar do sucedido em 1997 quando li no blog http://universidadealternativa.blogspot.com/ o seguinte:

“FORAM FAZER QUEIXA AO JUIZ! [...] A DENÚNCIA, INTENTADA À MINHA PESSOA [...] TEM UMA VEZ MAIS UM CARIZ INTIMIDATÓRIO. DIZ RESPEITO, SEGUNDO ELES, AO ENVIO DE NOTÍCIAS e COMENTÁRIOS sob a forma de e-mails PARA O BLOG DO PROFESSOR CADIMA RIBEIRO.” (Identifica-se como autor do texto Nuno Soares da Silva).

Em 1997, na qualidade de dirigente da Associação Cívica Arco-Íris, depois de bem informado, denunciei publicamente um plano para extinguir a Escola de S. João do Souto (1º ciclo). O plano estava já em marcha e ao ser extinta a escola, no mesmo local seria construída uma unidade hoteleira, bem no centro da cidade. Mas a Direcção da Escola, os professores, a Associação de Pais, as famílias residentes e o Presidente da Junta de Freguesia pretendiam conservar a escola naquele local.

A escola apresentava-se muito degradada, como pude constatar, e a directora reclamava obras urgentes por parte da Câmara Municipal, tornando público o seu protesto pela situação existente. A autarquia mantinha-se intransigente, alegando os responsáveis que o edifício não tinha condições “fisicotecnodidácticas” para funcionar como escola. Na sequência da minha denúncia o Sr. Presidente da Câmara de Braga moveu contra mim uma queixa-crime. As averiguações feitas no processo de inquérito apuraram de forma bem eloquente os factos que sustentavam as minhas alegações; concluiu o Juiz que eu tinha agido de boa-fé na defesa legítima de um interesse público. O negócio abortou e pouco tempo depois fizeram-se avultados investimentos de recuperação do edifício, gozando hoje a escola de boa saúde, livre de qualquer ameaça.

Com isto incomodaram-me sem razão, andei em stress e aborrecido com essa situação, fui duas vezes ao Tribunal, tive que arranjar um advogado etc. E no final provou-se que eu não tinha feito nada de condenável, pelo contrário, tinha agido na “defesa legítima de um interesse público”. A queixa-crime contra mim foi notícia nos jornais, mas não foi notícia o despacho do seu arquivamento. E no final não disponho de qualquer meio para exigir ser ressarcido dos danos que tudo isto me causou. Era justo poder fazê-lo, mas não posso.

É nisto que consiste a utilização dos tribunais como arma de intimidação e de dissuasão de uma conduta de cidadania – uma perversão do sistema democrático. Pessoas ou poderes a quem uma determinada conduta cívica incomoda, sabem que podem impunemente e de forma gratuita causar sérios danos na vida de uma pessoa de bem. Um cidadão que viva de forma digna, no estrito respeito da lei e em boa harmonia com a sociedade pode assim dar de caras com um agente da polícia à porta, intimando-o para comparecer em Tribunal.

É esse carácter intimidatório que aparenta a queixa apresentada contra Nuno Silva Soares. E a ser verdade que se invoca o envio de notícias e comentários em forma de email, e não algo que tenha sido publicado, fica para responder uma importante questão: será que a obtenção da matéria recolhida para a queixa lançou mão da violação das caixas de correio electrónico? A ver vamos... São grandes as suspeitas e rumores na UM sob essa matéria.

Não se deixem intimidar os que se movem com elevado sentido cívico e ético na defesa do bem comum. O mundo seria bem pior sem a sua determinação e coragem.

Não nos esqueçamos porém que a raposa dá as papas a comer à cegonha num prato raso. Por mais que se esforce, a cegonha jamais conseguirá sequer provar as papas.

4 comentários:

Anónimo disse...

Nem sempre a justiça resolve tudo...e se pela justiça nos atacam e difamam, e se dela não podemos beneficiar para nos defendermos então outros meios se justificam...

Anónimo disse...

Concordo... perde-se a paciência para o embuste quando um tribunal vem dizer que uma pessoa fez mal a alguém quando esse alguém montou um esquema ardiloso para transformar o agressor em vítima e a vítima em agressor. É de vomitar e apetece passar a outros meios. A instituição nega tudo e depois atira para cima da verdadeira vítima mais uma punição.

Anónimo disse...

"À força de ser justo, é-se muitas vezes culpado"
Autor: Corneille , Pierre

Anónimo disse...

Lá terá que ser...