Caros Colegas, Professores e Investigadores,
Continuo esforçando-me por entender o presente…
No século XVII, em Portugal o ensino dos jesuítas lutava fervorosamente contra o espírito da “Reforma que nascera da liberdade mental, do direito que cada um se arrogara de pensar por si” (Saraiva, 2004:222). Os dogmas da fé só poderiam sobreviver ao movimento libertador da Reforma, disciplinando a mente para não pensar, e assim o ensino por todo o País foi transformado “num alicerce para crer”. Consequentemente,
“a cultura desgarrou-se da vida e dos problemas vivos da época; evitou os temas quentes e as inovações que podiam chamar a atenção do inquisidor português (…). As palavras dissonantes eram arriscadas e os atrevimentos acabavam no cárcere. Por isso, a actividade mental encaminhou-se para dois caminhos: a submissão religiosa (…) e um puro culto da forma, que leva a usar da palavra como algo que vale por si, desligada da ideia. (Saraiva,2004: 221-223).
Enquanto Galileu, Descartes, Pascal, Espinosa, Bacon e Newton eram a expressão do esplendor da ciência na Europa, em Portugal a única influência vinda de fora era um Tratado de Ciência da Cabala - “uma erupção de irracionalismo, ocultismo e messianismo”. É o peso desta tradição do culto da forma que faz com que, nos meios académicos portugueses, muito do que hoje se diz ser ciência, particularmente em certas áreas, nada tem de científico. O estatuto de autoridade, que a ausência de espírito crítico levianamente concede à vacuidade retórica, sobrepõe-se à árdua tarefa de construção de rigorosos critérios de validação do conhecimento – esta bem mais produtiva, mas igualmente bem mais distante da ribalta.
Nos tempos eleitorais recentes e em curso na Universidade de Minho, têm sido postos em evidência esses traços de cultura do século XVII, a saber:
- disciplinar as mentes para não pensar;
- um discurso eleitoral de costas voltadas para a vida;
- evitar os temas quentes da vida na academia, porque isso paga-se caro;
- o subterfúgio da retórica, sem ideias nem relevância.
“Uma universidade que deve ser global” ou “uma governação democrática” são exemplos de slogans que recusam uma genuína reflexão sobre os problemas da vida da academia. “Universidade global” é uma expressão gongórica cujo conteúdo nos escapa. A “governação democrática”, sem referência à qualidade da vivência das pessoas no contexto laboral, remete-nos para a necessidade do exercício de desmontar o carácter instrumental de um discurso, cujos fins não coincidem com os enunciados. A “universidade cidadã”, que remete para a super-estrutura do CG, onde supostamente alguém fará um “teste à maturidade democrática” (como será o teste?), sem uma preocupação com os cidadãos que habitam a academia, é claramente um figura de retórica, na linha do vazio de ideias e da irrelevância face aos reais problemas.
Entre as listas A e C há um acordo tácito para evitar os temas quentes, tendo isso ficado patente nas últimas eleições (estimados amigos de um lado e de outro, isto é o debate – conto com o vosso fairplay). Com efeito, se ambos os projectos se apresentaram à academia com enunciados humanistas, valores democráticos, preconizando o primado da liberdade, o que haveria de ser discutido?
Continuo esforçando-me por entender o presente…
No século XVII, em Portugal o ensino dos jesuítas lutava fervorosamente contra o espírito da “Reforma que nascera da liberdade mental, do direito que cada um se arrogara de pensar por si” (Saraiva, 2004:222). Os dogmas da fé só poderiam sobreviver ao movimento libertador da Reforma, disciplinando a mente para não pensar, e assim o ensino por todo o País foi transformado “num alicerce para crer”. Consequentemente,
“a cultura desgarrou-se da vida e dos problemas vivos da época; evitou os temas quentes e as inovações que podiam chamar a atenção do inquisidor português (…). As palavras dissonantes eram arriscadas e os atrevimentos acabavam no cárcere. Por isso, a actividade mental encaminhou-se para dois caminhos: a submissão religiosa (…) e um puro culto da forma, que leva a usar da palavra como algo que vale por si, desligada da ideia. (Saraiva,2004: 221-223).
Enquanto Galileu, Descartes, Pascal, Espinosa, Bacon e Newton eram a expressão do esplendor da ciência na Europa, em Portugal a única influência vinda de fora era um Tratado de Ciência da Cabala - “uma erupção de irracionalismo, ocultismo e messianismo”. É o peso desta tradição do culto da forma que faz com que, nos meios académicos portugueses, muito do que hoje se diz ser ciência, particularmente em certas áreas, nada tem de científico. O estatuto de autoridade, que a ausência de espírito crítico levianamente concede à vacuidade retórica, sobrepõe-se à árdua tarefa de construção de rigorosos critérios de validação do conhecimento – esta bem mais produtiva, mas igualmente bem mais distante da ribalta.
Nos tempos eleitorais recentes e em curso na Universidade de Minho, têm sido postos em evidência esses traços de cultura do século XVII, a saber:
- disciplinar as mentes para não pensar;
- um discurso eleitoral de costas voltadas para a vida;
- evitar os temas quentes da vida na academia, porque isso paga-se caro;
- o subterfúgio da retórica, sem ideias nem relevância.
“Uma universidade que deve ser global” ou “uma governação democrática” são exemplos de slogans que recusam uma genuína reflexão sobre os problemas da vida da academia. “Universidade global” é uma expressão gongórica cujo conteúdo nos escapa. A “governação democrática”, sem referência à qualidade da vivência das pessoas no contexto laboral, remete-nos para a necessidade do exercício de desmontar o carácter instrumental de um discurso, cujos fins não coincidem com os enunciados. A “universidade cidadã”, que remete para a super-estrutura do CG, onde supostamente alguém fará um “teste à maturidade democrática” (como será o teste?), sem uma preocupação com os cidadãos que habitam a academia, é claramente um figura de retórica, na linha do vazio de ideias e da irrelevância face aos reais problemas.
Entre as listas A e C há um acordo tácito para evitar os temas quentes, tendo isso ficado patente nas últimas eleições (estimados amigos de um lado e de outro, isto é o debate – conto com o vosso fairplay). Com efeito, se ambos os projectos se apresentaram à academia com enunciados humanistas, valores democráticos, preconizando o primado da liberdade, o que haveria de ser discutido?
A discussão faz-se com recurso à palavra, contrapondo argumentos ao que é tido por diferente, contrário. Todavia, se nos enunciados fundamentais não há contradição mas convergência, toda a discussão é um exercício de retórica redundante, em torno de uma mesma coisa. Navega-se num consenso difuso, sem vectores, como se o objecto de discussão - a vida académica - fosse uma realidade sem esboço de forma, desprovida de arestas, de vértices, de tudo o que aponte um sentido de diferença ou de ruptura. O debate não existe e o pensamento fica enclausurado: o dos candidatos, o dos que querem intervir no debate e o dos que ouvem.
Para as pessoas que vivem a sua actividade académica como um fardo pesado que carregam para ganhar a vida - habitando o espaço universitário sem o calor dos afectos, onde se sentem excluídas, humilhadas, desrespeitadas, não estimuladas - pouco importam as grandes considerações sobre a missão da Universidade. A força e a vitalidade de uma organização assentam na saúde do tecido social que a sustenta (Bhom & Peat, 1995; Goleman, 1995). Isso requer um debate orientado para um esforço de transformação da cultura institucional vigente, que tenha no horizonte uma vivência académica subordinada a princípios e valores adoptados pelo Movimento que dá corpo à lista B: honestidade, confiança, transparência, respeito e responsabilidade (ver http://um-novosdesafios.net ).
É pois necessário falar das venalidades enraizadas na cultura institucional, a saber: o desrespeito da legalidade; o autoritarismo e a intimidação; a atmosfera de medo e de opressão; a violação de direitos legítimos das pessoas; o favorecimento de uns em detrimento de outros; a degradação das relações interpessoais; o clientelismo; as restrições à liberdade de expressão; as situações de injustiça, sem apelo nem recurso; a intromissão abusiva em matérias científicas em função do cargo que se exerce e não de critérios científicos; ausência de liberdade de escolha de orientadores científicos e de temáticas de investigação.
São particularmente os docentes mais jovens que mais sentem este tipo de problemas e mais vulneráveis se encontram para lhes fazer face. Um futuro de maior esperança para eles passa pelo fortalecimento do Movimento Novos Desafios, Novos Rumos, que intervém agora através da candidatura da lista B ao CG e prosseguirá a sua intervenção académica no futuro, no sentido da construção de uma comunidade académica mais justa e humanizada.
Joaquim Sá
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