Em 1996, ao concluir a minha tese de Doutoramente escrevia:
"Ao longo de cerca de 6 anos, tivemos a oportunidade de constatar que as escolas do 1º ciclo de hoje oferecem as mesmas condições de ensino que as escolas frequentadas pelo investigador, há mais de 30 anos. Igualmente se constata que as práticas não sofreram grandes alterações: o livro, lápis e papel (em substituição da lousa de outros tempos) continuam a ser os materiais didácticos praticamente exclusivos. As crianças raramente vêem uma balança e massas marcadas quando lhes são ensinadas as unidades de massa; raramente vêem a medida de litro e seus submúltiplos quando estas noções lhes são ensinadas; aprendem mecanicamente a andar com vírgulas para esquerda e para a direita, sem nunca terem realizado a experiência de transvasarem uma medida de decilitro cheia de água para dentro de uma medida de litro, e assim constatarem experimentalmente que 1 litro é equivalente a 10 decilitros. (…) E como não podia deixar de ser, neste panorama de imobilismo, a abordagem que é feita às Ciências da Natureza, 23 anos após a sua inclusão no programa do 1º ciclo, apesar das recomendações e orientações de natureza construtivista e experimental, resume-se à memorização de alguns termos científicos por parte dos alunos." (Sá, 1996, pg. 510-511) 1.
Passaram-se mais 10 anos e não se vislumbra que o quadro descrito tenha sofrido significativas alterações. A democracia perdeu-se num discurso pedagógico "progressista", sem chegar a compreender a natureza das profundas raízes históricas, culturais e ideológicas das concepções e práticas que continuam a ter uma expressão dominante nas escolas do 1º ciclo. O País não foi capaz de avaliar o peso de uma tradição enformada pelo pensamento do ministro da Educação de Salazar, Carneiro Pacheco, que, em 1936, proclamava que "o ensino primário elementar trairia a sua missão se continuasse a sobrepor um estéril enciclopedismo racionalista, fatal para a saúde moral e física da criança, ao ideal prático e cristão de ensinar bem a ler, escrever e contar, e exercer as virtudes morais …" (DL. Nº 27 279, de 24 de Novembro). Por isso, não se fez o que era necessário fazer para operar a mudança que o País precisava.
"Ao longo de cerca de 6 anos, tivemos a oportunidade de constatar que as escolas do 1º ciclo de hoje oferecem as mesmas condições de ensino que as escolas frequentadas pelo investigador, há mais de 30 anos. Igualmente se constata que as práticas não sofreram grandes alterações: o livro, lápis e papel (em substituição da lousa de outros tempos) continuam a ser os materiais didácticos praticamente exclusivos. As crianças raramente vêem uma balança e massas marcadas quando lhes são ensinadas as unidades de massa; raramente vêem a medida de litro e seus submúltiplos quando estas noções lhes são ensinadas; aprendem mecanicamente a andar com vírgulas para esquerda e para a direita, sem nunca terem realizado a experiência de transvasarem uma medida de decilitro cheia de água para dentro de uma medida de litro, e assim constatarem experimentalmente que 1 litro é equivalente a 10 decilitros. (…) E como não podia deixar de ser, neste panorama de imobilismo, a abordagem que é feita às Ciências da Natureza, 23 anos após a sua inclusão no programa do 1º ciclo, apesar das recomendações e orientações de natureza construtivista e experimental, resume-se à memorização de alguns termos científicos por parte dos alunos." (Sá, 1996, pg. 510-511) 1.
Passaram-se mais 10 anos e não se vislumbra que o quadro descrito tenha sofrido significativas alterações. A democracia perdeu-se num discurso pedagógico "progressista", sem chegar a compreender a natureza das profundas raízes históricas, culturais e ideológicas das concepções e práticas que continuam a ter uma expressão dominante nas escolas do 1º ciclo. O País não foi capaz de avaliar o peso de uma tradição enformada pelo pensamento do ministro da Educação de Salazar, Carneiro Pacheco, que, em 1936, proclamava que "o ensino primário elementar trairia a sua missão se continuasse a sobrepor um estéril enciclopedismo racionalista, fatal para a saúde moral e física da criança, ao ideal prático e cristão de ensinar bem a ler, escrever e contar, e exercer as virtudes morais …" (DL. Nº 27 279, de 24 de Novembro). Por isso, não se fez o que era necessário fazer para operar a mudança que o País precisava.
As salas de aula desse nível de ensino continuam a ser, em grande parte, lugares inóspitos, desertos de recursos didácticos, onde impera o cinzentismo pedagógico de giz e quadro (lápis e papel) da “instrução primária” de há 40 anos. Por isso, as nossas crianças não têm a oportunidade de desenvolver os conceitos primários que se constroem na relação directa com os objectos concretos, manipulando-os, sentindo-os e experimentando-os. Sem os conceitos primários faltam os alicerces para a construção do edifício de conceitos indispensáveis à cidadania e a uma formação profissional de qualidade.
Não ocorreram melhorias significativas nos alunos portugueses, entre os dois [últimos] estudos, ao contrário de alguns outros países. A Polónia constitui o exemplo mais notável de um avanço significativo, em consequência de uma reforma educativa iniciada em 1999.
Excerto do livro:
Sá, J. & Varela, P. (2007). Das Ciências Experimentais à Literacia: uma proposta didáctica para o 1º ciclo. Porto: Porto Editora. (http://www.iec.uminho.pt/ModuleLeft.aspx?mdl=~/Modules/Generic/GenericView.ascx&ItemID=141&Mid=34&lang=pt-PT&pageid=22&tabid=10 )
1. Sá, J. G. (1996). Estratégias de Desenvolvimento do Pensamento Científico em Crianças do 1º Ciclo do Ensino Básico. Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Braga.
2. Sá, J. (2002). Renovar as Práticas no 1º Ciclo pela Via das Ciências da Natureza. Porto: Porto Editora, 2ª edição (1ª edição, 1994).
1 comentário:
Olá professor!
Foi com muito agrado que o descobri neste blog. Fui sua aluna no IEC à pouco tempo e encontro-me a trabalhar à dois anos. Admiro-o pelo seu trabalho e força de convicções. Espero que continue por muito tempo a "mexer" com o pensamento de muitas pessoas!
Até breve,
Sissi Azevedo
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